Histerectomia: procedimento do passado, presente ou futuro?

Histerectomia: procedimento do passado, presente ou futuro?

(foto: Pixabay)

Não é de hoje que vejo mulheres nos consultórios ginecológicos solicitando a histerectomia como se ela fosse a solução dos seus problemas

No Brasil, existe uma cultura por parte das mulheres e dos médicos de que o útero só serve para te dar filhos e provocar câncer no futuro.

Já na África, as mulheres acreditam na importância da manutenção do útero, pois culturalmente elas precisam sangrar até a menopausa (última menstruação).

A histerectomia (retirada do útero) constitui atualmente uma das cirurgias mais realizadas em todo o mundo, perdendo apenas para a cesariana.

A primeira proposta de histerectomia total abdominal foi descrita em 1843 por Charles Clay Manchester citado por Bachman, a qual apresentou resultados fatais. Em 1930, Richardson citou Broder et al, sistematizou o procedimento.

Nos Estados Unidos, mais de 600.000 histerectomias são realizadas a cada ano e acredita-se que mais de 20 milhões de americanas já foram submetidas a este procedimento.

As indicações por doenças benignas são responsáveis por 90% dos casos, ao passo que as doenças malignas representam apenas 10%.

O risco de mortalidade é considerado baixo em torno de 1 a 2 para cada 1000 intervenções, conseqüência direta dos progressos no tratamento das doenças clínicas associadas, dos cuidados pré e pós-operatórios, do uso adequado de hemotransfusão e antibióticos, bem como dos avanços nas técnicas cirúrgicas e anestésicas.

Apesar de ter se tornado uma cirurgia de baixo risco e relativamente segura na atualidade, a morbidade associada à histerectomia não é desprezível, por isso não pode ser banalizada e nem indicada a todas as pacientes.

As complicações pós-operatórias dependem da via utilizada, estimando-se que 25% das histerectomias vaginais e 50% das histerectomias abdominais cursem com algum tipo de complicação (infecção, trombose, lesões estruturais, sangramento entre outros).

A morbidade infecciosa representa uma das complicações mais importantes associadas à histerectomia, ocorrendo em frequência variável de 4-50% em função da via utilizada.

Diversos fatores de risco têm sido apontados para o desenvolvimento de infecção pós-operatória, como o baixo nível socioeconômico, a idade avançada, obesidade, diabetes, neoplasias malignas, tempo cirúrgico aumentado, hospitalização prolongada e uso de drenos.

O risco de trombose venosa profunda (TVP) durante uma histerectomia também depende de parâmetros como idade, porte cirúrgico, tempo cirúrgico, fatores de risco pessoal e familiar e indicação do procedimento (câncer).

A incidência de TVP em uma cirurgia abdominal varia de 10-42% sendo estimado em 23% na histerectomia abdominal.

O uso de anticoagulantes profiláticos juntamente com alguns cuidados estão associados a uma redução dos riscos.

Lesões do aparelho urinário (ureter e bexiga) e aparelho intestinal (reto e sigmoide) podem ocorrer em até 1% dos pacientes dependendo da indicação, da via e do tipo de cirurgia realizada com tratamento geralmente durante o mesmo tempo cirúrgico.

A hemorragia ocorre raramente após tais procedimentos, podendo ser necessário transfusões sanguíneas. A perda de sangue média é de 500 ml sendo maior na histerectomia abdominal e menor na vaginal.

A remoção do útero mesmo sem a remoção do ovário pode acelerar os sintomas da menopausa ao atrapalhar a vascularização do mesmo.

A histerectomia isoladamente não afeta a sexualidade, podendo até mesmo ajudar se existe um problema real. Importante orientar que não fique um buraco no local onde estava o útero!

Infelizmente a via abdominal continua sendo a mais frequentemente realizada e justificada de forma errada ao defenderem que o médico deve utilizar aquela via que ele faz melhor quando ele deveria ofertar a melhor e mais segura para a paciente.

A via laparoscópica ganhou popularidade nos últimos 20 anos, principalmente com o advento da robótica, apesar de ter sido descrita por Reich em 1989.

As indicações cirúrgicas são variadas, tais quais leiomiomatose uterina, adenomiose, prolapso uterino, tratamento sintomático da dor pélvica crônica e sangramento uterino anormal resistente ao tratamento médico.

A FIGO (Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia) definiu em 2011 que o sangramento uterino anormal em mulheres não grávidas deve ser classificado de acordo com a nova nomenclatura denominada PALM-COEIN, o qual separa as causas estruturais (pólipos, adenomiose, leiomiomas e malignidade) das não estruturais (coagulopatias, alterações ovulatórias, endometriais, outras não especificadas).

A principal contribuição ao meu ver foi enfatizar que os problemas estruturais e funcionais são distintos, mas podem coexistir e se potencializar.

Mesmo assim, a histerectomia continua sendo uma cirurgia muito realizada e desejada apesar de avanços com terapias medicamentosas e de tratamentos menos invasivos.

Devemos lembrar que o útero apenas obedece às ordens dadas pelos ovários!

Sendo assim, ao desligarmos os ovários ou retirá-los os problemas uterinos estariam resolvidos! Na prática não é fácil assim!

Desligamos os ovários com medicações capazes de bloquear o funcionamento completo ou parcial. É lógico que temos ônus e bônus que não serão discutidos aqui hoje.

A única indicação de retirada dos ovários são pacientes com risco genético de câncer de ovário e de mama antes dos 40 anos de idade. Nos outros casos teríamos uma mortalidade aumentada por problemas cardiovasculares e osteoporose no longo prazo!

Nos anos 2000, durante a minha pós-graduação na Bélgica, tive acesso a terapias ginecológicas minimamente invasivas pouco utilizadas hoje pelo custo elevado ou pela falta de treinamento.

Grande parte dos médicos ginecologistas e obstetras terminam hoje suas residências sem condições de realizar com segurança histerectomia por qualquer via que seja, precisando muitas vezes complementar sua formação com cursos de pós-graduação (laparoscopia, histeroscopia e cirurgia vaginal) como os da Faculdade Ciências Médicas de MG – FELUMA – no qual faço parte há 15 anos.

O resultado é uma estagnação ou retrocesso da ginecologia que insiste em realizar a mesma medicina que meus avós faziam na década de 50.

Precisamos manter a capacidade preventiva da especialidade ginecológica que quando bem realizada vai evitar uma histerectomia em 90% dos casos ao invés de acreditar que o futuro é a retirada de todos os úteros.

Gustavo Safe é diretor e médico especialista em endometriose no Centro Avançado em Endometriose e preservação da fertilidade, Clínica Ovular fertilidade e menopausa e Instituto Safe. Estudioso dos assuntos relacionados à saúde da mulher com enfoque na dor pélvica, infertilidade, preservação da fertilidade, endometriose, endoscopia ginecológica e cirurgias minimamente invasivas.

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A menopausa e os seus desafetos

A menopausa e os seus desafetos

A menopausa tem impactos profundos na qualidade de vida das mulheres (foto: Marcus Aurelius / Pexels)

A menopausa é um ponto, uma data (a última menstruação) que representa um período nada fácil para a mulher onde a conjunção de fatores emocionais e físicos acabam afetando o equilíbrio.

Imagine uma mulher que sabe o que quer, chega aos 50 anos bem estabelecida profissionalmente e financeiramente com responsabilidades, com filhos no final da adolescência ou saindo de casa, pais ausentes ou com a saúde debilitada, correria do dia a dia tentando conciliar o social, a casa, o marido e de repente você fica completamente sem estrogênio, sem energia,  sem gás, com o tanque vazio!

No período pós menopausa cessa a secreção estrogênica oriunda do ovário, permanecendo a produção de androstenediona pela suprarrenal, que é transformada em estroma (estrogênio fraco) pelo tecido adiposo, músculo, fígado e cérebro para depois  ser convertida parcialmente em estradiol (estrogênio forte).

A título de comparação, os valores do estradiol que variam de 40 a 250pg/ml durante o ciclo menstrual normal passam a ser de  apenas 13pg/ml na pós menopausa, enquanto a estrona que no ciclo normal flutua entre 40 e 70pg/ml terá uma diminuição menor com valores de 30 pg/ml.

O ovário não pára completamente de funcionar após a menopausa, pois o estroma ovariano continua a produzir testosterona (exclusiva do ovário) que cai de 100ng/ml para 0,2ng/ml além da androstenediona que pode chegar a 2,26ng/ml cai a 0,9ng/ml na pós menopausa.

Esta queda importante de todos estes hormônios esteroides é responsável por repercussões como ondas de calor, secura vaginal, disfunção sexual, depressão, risco aumentado de osteoporose, demência, problemas cardiovasculares, entre outros.

Quando observamos a pirâmide etária do Brasil e de Minas Gerais  (MG) percebemos que a população está envelhecendo se confrontarmos os dados de 2016 (13,5% de idosos em MG e 12,1% no Brasil) com as estimativas de 2030 (17,8% de idosos em MG e 16,7% no Brasil).

Acredito na importância desta transição menopausal para as mulheres que acabam passando metade da vida neste período de climatério e senilidade.

As candidatas à terapia de reposição hormonal (TRH) são mulheres saudáveis, sintomáticas nos primeiros 10 anos da pós menopausa e/ou com menos de 60 anos e que não têm contraindicações como suspeita ou confirmação de câncer de mama, suspeita ou confirmação de tumor dependente de estrogênio, sangramento genital anormal de etiologia desconhecida, doença hepática ativa e antecedente de trombose e embolia venosa.

Na prática não é simples assim, pois a maior parte das mulheres que se encaixam neste perfil acabam não fazendo a TRH por questões pessoais, culturais ou sociais.

O primeiro desafio da TRH consiste na dificuldade das mulheres identificarem essa necessidade de reposição, pois os sintomas se instalam de forma gradativa neste período de transição, conhecido como a perimenopausa, que é o final do período reprodutivo caracterizado por irregularidade no ciclo menstrual que começa 2 a 5 anos antes da menopausa e se estende até um ano após.

Neste período, as mulheres podem apresentar ciclos curtos com menos de 25 dias ou ciclos longos com mais de 35 dias associado a sintomas menopausais apesar de não estarem ainda com queda importante do estrogênio.

O uso de hormônios (progesterona) isolados ou não com objetivo de regularizar o ciclo menstrual e proteger a paciente está bem indicado, mas é pouco utilizado na prática clínica.

As obesas têm a produção elevada de estrona a partir da aromatização periférica no tecido adiposo, com menor produção hepática da globulina ligadora de esteróides sexuais (SHBG) levando a uma maior proporção de estradiol na forma livre com maiores níveis séricos absolutos de estradiol e estrona.

Estas pacientes apresentam assim menos efeitos da falta do estrogênica, com menos sintomas e menos risco de osteoporose apesar de serem mais propensas ao câncer de endométrio devido ao estímulo de estrogênio sem oposição da progesterona.

A TRH é hoje reconhecida como o tratamento mais eficaz para redução ou eliminação dos sintomas do climatério, proteção óssea e cardiovascular, quando bem indicada e individualizada.

Leia também: A ciência dos fito-hormônios no tratamento dos sintomas climatéricos

O Segundo desafio consiste em melhorar os sintomas e ao mesmo tempo gerar proteção sem aumentar o risco com a menor dose possível de estrogênio e pelo menor tempo possível.

Os fogachos afetam até 75% das mulheres na perimenopausa e persistem por um a dois anos após a menopausa com apenas 5% que manterão os sintomas cinco anos depois.

São caracterizados por ondas de calor de início repentino, geralmente na cabeça, pescoço ou tórax, que pode ser acompanhado de rubor, sudorese e calafrios, aumento da temperatura corporal, vasodilatação periférica e aumento transitório dos batimentos cardíacos.

Eles são muitas vezes os principais responsáveis pela perda da qualidade de vida da mulher que, através de um ciclo vicioso, não consegue dormir, trabalhar e ter uma vida social satisfatória, levando a quadros de depressão e ansiedade.

Pacientes que não são candidatas a TRH podem usar medicações como a Clonidina ou antidepressivos como a  Paroxetina, Venlafaxina e a Gabapentina no combate aos fogachos.

Outro sintoma importante é a atrofia, onde a ausência de estrogênio faz com que o tecido vulvar e vaginal se retraia, suas paredes tornam-se finas e secas e as dobras desaparecem, provocando ressecamento e prurido vaginal, dor na relação sexual, dor e urgência urinária.

Manifestam-se em média três anos após a menopausa em 15% a 38% das mulheres acima de 55 anos.

O tratamento pode ser com estrogenioterapia tópica através de cremes, comprimido, ou apenas sintomáticos como hidratantes e lubrificantes.

O laser vaginal e vulvar tem se tornado uma ferramenta importante, principalmente em pacientes com passado ou risco aumentado de câncer que não podem fazer TRH.

A osteoporose é um distúrbio esquelético que compromete a resistência dos ossos em razão da redução progressiva na massa óssea com maior risco de fratura. 

A osteopenia é a precursora da osteoporose e já demanda atenção por parte da paciente e do médico quando presente nos primeiros anos da pós menopausa.

A densitometria óssea é o exame responsável pelo diagnóstico devendo ser realizado a partir dos 65 anos em pacientes sem risco e entre 50 e 69 anos nas mulheres com risco.

Além da TRH, as mulheres podem se beneficiar do uso dos Bifosfonatos, Alendronato, Risedronato, Ibandronato, Raloxifeno, Calcitonina e a Teriparatida (PTH recombinante).

A disfunção sexual ou o menor interesse ou desejo de iniciar a atividade sexual, a redução da excitação ou da capacidade de atingir o orgasmo durante as relações sexuais tem causa multifatorial podendo ser agravada neste período.

Um correto controle da depressão, um aconselhamento conjugal, uma terapia sexual e um tratamento da atrofia genitourinária são importantes nesta abordagem.

A terapia androgênica em mulheres com baixos níveis de androgênios sem outras causas identificáveis de problema sexual pode ser útil após uma seleção correta das candidatas

A doença cardiovascular (DCV) é a principal causa de morte em mulheres, sendo responsável por aproximadamente 45% da mortalidade agravada pelo tabagismo, sedentarismo, obesidade entre outros.

A TRH reduz os níveis de colesterol total e LDL, aumenta os níveis de HDL, diminui níveis séricos de lipoproteínas responsáveis pela aterosclerose além de reduzir a resistência à insulina favorecendo o controle da glicose.

Menos de 20 anos depois do início da TRH, ela foi colocada em xeque  pela Women’s Health Initiative (WHI), pois em algumas de suas pesquisas, o WHI alertava para os riscos de doença arterial coronariana, acidente vascular cerebral, assim como trombose e câncer de mama associados à TRH, afirmando que os riscos eram, em muitos casos, superiores aos benefícios de alívio dos sintomas relacionados ao climatério. 

A TRH deve ser suspensa assim que os benefícios por ela gerados não forem mais necessários ou a partir do momento em que a relação benefício versus risco, se torna desvantajosa, gerando um terceiro desafio.

Como suspender a TRH nas pacientes com 10 anos de uso ou com mais de 60 anos que estão cada vez mais ativas (geração prateada) e sem desejo de apresentar muitos dos sintomas que foram postergados.

Estas pacientes podem assinar um contrato de risco com elas mesmas e continuar a utilizar a TRH com um controle médico rigoroso, pois não há uma definição de duração máxima obrigatória ou idade máxima na qual esta deva ser suspensa.

O quarto desafio é o risco de câncer de mama associado a uso de TRH que é real, com incidência anual de menos de 1 caso por 1.000 mulheres com incremento com regime terapêutico estroprogestativo após cinco anos de uso.

Os dados existentes não permitem afirmar diferenças quanto ao risco conforme o tipo, a dose e as vias de administração. 

A TRH combinada tem efeito protetor na incidência de câncer colorretal e não se associa a aumento no risco de neoplasias da tireoide, tumores de pele melanoma e não melanoma, tumores hepático, renal e nas doenças hematológicas malignas.

O quinto e último desafio é adequar a TRH (dose, o regime, a via de admnistração, o tipo de medicação) às necessidades das pacientes como o aumento da libido, a diminuição do inchaço corporal,  a melhora da pele, o correto equilíbrio da pressão arterial e do diabetes, a diminuição ou manutenção da gordura abdominal e o risco de trombose.

A Terapia hormonal bioidêntica é aquela realizada com hormônios com estrutura química idêntica à observada naqueles naturalmente produzidos pelas mulheres não havendo evidências científicas suficientes para sugerir e apoiar as alegações de que as manipulações dos denominados “hormônios bioidênticos”, sendo importante a consulta com especialistas.

 

Gustavo Safe é diretor e médico especialista em endometriose no Centro Avançado em Endometriose e preservação da fertilidade, Clínica Ovular fertilidade e menopausa e Instituto Safe. Estudioso dos assuntos relacionados à saúde da mulher com enfoque na dor pélvica, infertilidade, preservação da fertilidade, endometriose, endoscopia ginecológica e cirurgias minimamente invasivas.

Acesse: Clinica Ovular –  Fertilidade e Menopausa para mais informações.

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A prolactina e sua importância na vida da mulher

A prolactina e sua importância na vida da mulher

(Aumento da PRL -hiperprolactinemia- está diretamente relacionada ao aleitamento em pacientes grávidas / foto: Pexels)

A prolactina tem importante papel não só na mama, influenciando o controle do ciclo menstrual, da fertilidade, do diabetes e da obesidade

A prolactina (abreviada como “PRL”) é um hormônio secretado pelas células lactotróficas da hipófise anterior e tem como principal função estimular a produção de leite pelas glândulas mamárias e promover o desenvolvimento das mamas. 

A PRL foi descoberta pelo endocrinologista canadense Dr Henry Friesen em 1960, e faz parte da família das somatotropinas (hormônio do crescimento).

Está presente na circulação nas formas de um monômero com 199 aminoácidos e peso molecular de 23 kDa (little prolactina) e de um dímero com peso molecular em torno de 45 kDa (big  prolactina) que podem coexistir no mesmo indivíduo. 

A macroprolactina é uma forma de alto peso molecular com 150 – 170 kDa (big big prolactina), que geralmente corresponde ao complexo antígeno-anticorpo formado pela prolactina de peso molecular 23 kDa e a imunoglobulina IgG. 

Cerca de 80-90% da PRL total presente no sangue dos indivíduos normais e de pacientes com prolactinoma, está na forma monomérica com peso molecular de 23 kDa e apenas 10% do total estão na forma big e big big prolactina.

O aumento da PRL (hiperprolactinemia) está diretamente relacionada ao aleitamento em pacientes grávidas e puérperas, mas seu aumento pode trazer outras repercussões fora deste período.

Quando o soro do paciente apresenta um predomínio da forma big big prolactina, o achado é denominado de macroprolactinemia.

Sua principal função consiste em regular o desenvolvimento e diferenciação da glândula mamária (efeito mamogênico) durante a gestação e estimular a lactação no período pós-parto (efeitos lactogênicos e galactopoéticos). 

A PRL é predominantemente produzida e secretada pelos lactotrófos hipofisários, cujo número aumenta radicalmente ao final da gestação mas pode ter fontes extra-pituitárias de liberação no cérebro, glândula mamária, fibroblastos cutâneos, placenta, decídua, âmnio, útero, entre outros. 

O estriol é o principal estimulante na secreção de PRL, e seus níveis estão muito maiores na gestação, justificando a hiperprolactinemia fisiológica que ocorre neste período onde o efeito lactogênico da PRL é inibido pela progesterona e pelo próprio estrogênio, de modo que este hormônio atua apenas no desenvolvimento mamário. 

Outros hormônios estão envolvidos na secreção de prolactina, sendo os principais o hormônio liberador de tireotrofina (TRH), a serotonina, o peptídeo intestinal vasoativo, a vasopressina, a insulina, glicocorticóides e a ocitocina que é responsável pela ejeção do leite além de manter o útero contraído (através da sucção).

A amamentação noturna é essencial para a promoção da lactogênese!

Por outro lado, a dopamina é o principal inibidor da liberação da PRL junto com a noradrenalina, somatostatina, histamina, óxido nítrico, ácido gama-aminobutírico, mantendo o equilíbrio da secreção desse hormônio. 

Existem evidências, ainda, que a PRL atua no metabolismo da glucose sendo responsável por ações insulinotrópicas, incluindo a sobre regulação da expressão e atividade glucokinase  (enzima que metaboliza a glicose nas células). 

No tecido adiposo a PRL está envolvida em muitos processos  abrangendo a adipogênese, a lipólise e a liberação de adipocinas, como a adiponectina e a leptina. 

A hiperprolactinemia parece influenciar no desenvolvimento de distúrbios como a diabetes mellitus e a obesidade

É importante destacar que a PRL alta pode ser desencadeada por inúmeros fatores, como o estresse, uso de remédios que tenham efeitos sobre a hipófise, como os anticoncepcionais, doenças renais, doenças da parede torácica ou que acometem os sistema nervoso central, tumor na hipófise, gravidez e os antidepressivos tricíclicos (antagonistas da dopamina).

Ao se deparar com o aumento nos níveis de PRL na ausência de sintomas compatíveis com hiperprolactinemia, é preciso suspeitar da presença de macroprolactina. 

Em até 25% dos casos de hiperprolactinemia, a forma circulante principal é a macroprolactina, que se denomina macroprolactinemia

Para descobrir se a hiperprolactinemia se dá às custas de prolactina ou de macroprolactina, é feito um teste específico que mostra os seguintes resultados:

Hiperprolactinemia verdadeira (forma monomérica) – recuperação > 65% da quantidade de prolactina inicial

Resultado inconclusivo – recuperação entre 30 e 65%

Presença de macroprolactina – recuperação < 30% da forma monomérica, isto é, aproximadamente 70% da dosagem de prolactina inicial foi às custas da macroprolactina

Uma das causas patológicas de hiperprolactinemia incluem as doenças hipotálamo-hipofisária como os adenomas.

As causas do adenoma hipofisário ainda são desconhecidas, no entanto alguns estudos mostram que este tipo de tumor pode ocorrer por alterações no DNA das células.

  1.  Adenoma lactotrófico tem como característica a hiperprolactinemia que é o aumento do hormônio prolactina, cujo o principal sintoma é a produção de leite nas mamas de mulheres que não estão em fase de amamentação, além da  diminuição do apetite sexual, infertilidade, alterações menstruais.
  2.  Adenoma somatotrófico caracteriza-se pelo aumento da produção do hormônio do crescimento e pode causar uma condição conhecida como acromegalia, em adultos, ou gigantismo, em crianças.
  3.  Adenoma corticotrófico relaciona-se ao aumento da produção do hormônio cortisol que é responsável por causar a síndrome de Cushing.
  4.  Adenoma gonadotrófico está relacionado com o aumento da produção de hormônios que controlam a ovulação em mulheres, mas não apresenta sintomas específicos.
  5.  Adenoma tireotrófico é um tipo de adenoma hipofisário em que há aumento da produção dos hormônios da tireóide o que pode provocar hipertireoidismo.
  6.  Adenoma não secretor é um tipo de adenoma hipofisário que não interfere na produção de hormônios, não causando aumento de hormônios e geralmente não apresenta sintomas. Porém, se o adenoma continuar crescendo, pode causar pressão sobre a hipófise e resultar em alterações hormonais.

Para detectar os níveis de PRL, o médico especialista observa o histórico da paciente e solicita exames de sangue convencionais, que, por sua vez, medem a dosagem da prolactina no sangue.

Os valores de referência considerados normais são de até 29 ng/mL no sangue.  Valores acima de 100 ng/mL sugerem o quadro de prolactinoma (tumor da hipófise).

Prolactinomas são a causa mais frequente de hiperprolactinemia patológica, causada por um tumor dos lactotróficos. Representa cerca de 60% de todos tumores hipofisários e mais de 75% dos adenomas hipofisários em mulheres. As mulheres têm vinte vezes mais desses tumores que os homens. 

Cerca de 50% das mulheres têm galactorréia(saída de leite do peito) com possibilidade de redução da densidade óssea por redução dos hormônios sexuais (testosterona e estrógeno) com aumento do risco de fraturas ósseas.

Quanto ao tamanho, esses tumores são divididos em microprolactinoma se menor que 10mm e macroprolactinoma se igual ou acima de 10mm.

Níveis séricos de prolactina até 250 ng/mL são compatíveis com macroprolactinomas, e maiores que isso, sugerem macroprolactinomas. 

Apesar das flutuações que podem ocorrer em indivíduos normais, sugere-se que se realize a pesquisa da macroprolactina nos casos de hiperprolactinemia, estabelecendo um valor de corte em torno do dobro do valor normal. 

Uma pessoa com níveis elevados de PRL sérica, não apresenta sintomas típicos de hiperprolactinemia e/ou ressonância magnética com evidências de tumor hipofisário, suspeita-se da ocorrência de macroprolactinemia. 

Vários estudos sugerem que nos pacientes com macroprolactinemia, a investigação por imagem só deveria ser realizada quando fossem encontrados sinais clínicos que justificassem tal investigação. 

A avaliação do custo-benefício na realização da pesquisa de macroprolactina nas amostras com hiperprolactinemia, no momento, está bem demonstrada mais econômico fazer a pesquisa de macroprolactina nos casos de hiperprolactinemia em pacientes sem sinais clínicos, do que submetê-los a investigação por imagem.

Os sintomas da mulher relacionados a PRL podem variar sendo os mais comuns a infertilidade (associação com a síndrome dos ovários policísticos), a diminuição da libido, menor lubrificação vaginal, dor na relacao sexual, abortos espontâneos recorrentes, ciclo menstrual irregular, dor de cabeca e disturbios visuais.

O tratamento da prolactina alta vai depender da sua causa com boa resposta ao tratamento com medicações orais sendo raramente necessário a cirurgia.

A cirurgia é indicada quando o adenoma hipofisário é do tipo não secretor e maior que 1 centímetro com sintoma de perda ou alteração da visão.

Quando o tumor não secretor é menor que 1 centímetro ou sem sintomas, o tratamento é feito com acompanhamento médico regular e realização de ressonância magnética regularmente.

As medicações utilizadas para o tratamento tanto de micro como de macroprolactinoma são os agonistas dopaminérgicos (bromocriptina e cabergolina) que são eficazes na grande maioria dos casos para reduzir tanto os níveis de prolactina como o tamanho do tumor. 

Cirurgia, radioterapia e outras drogas (como temozolomida) devem ser reservadas para casos de tumores resistentes ao tratamento convencional ou agressivos.

Em resumo, o diagnóstico de prolactinoma leva em consideração a exclusão de outras causas de hiperprolactinemia, incluindo a macroprolactinemia. 

Embora os prolactinomas sejam a causa mais frequente de hiperprolactinemia, o tratamento desses tumores raramente necessita de cirurgia.  

O tratamento e acompanhamento geralmente é realizado pelo endocrinologista embora muitas manifestações são percebidas pelo ginecologista que acaba fazendo o diagnóstico.

Gustavo Safe é diretor e médico especialista em endometriose no Centro Avançado em Endometriose e preservação da fertilidade, Clínica Ovular fertilidade e menopausa e Instituto Safe. Estudioso dos assuntos relacionados à saúde da mulher com enfoque na dor pélvica, infertilidade, preservação da fertilidade, endometriose, endoscopia ginecológica e cirurgias minimamente invasivas.

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Anticoncepção hormonal e seus vários benefícios

Anticoncepção hormonal e seus vários benefícios

(foto: Pexels Mart Production)

Em consultas, uso da pílula anticoncepcional cada vez mais frequente ainda traz questionamentos às vezes infundados neste mundo de informação e desinformação

Alguns questionamentos levantados são sobre os efeitos que o uso dos hormônios (como o anticoncepcional) a longo prazo pode trazer para o organismo da mulher.

Na minha opinião, a mulher moderna deve priorizar a melhora da qualidade de vida e a proteção da fertilidade através do uso dos medicamentos hormonais (por exemplo, o anticoncepcional) cada vez mais modernos e com menos efeitos colaterais.

Um deles corresponde ao impacto que a substância pode ter na fertilidade, pois a grande maioria das mulheres passa boa parte de suas vidas utilizando o medicamento.

Não existe nenhum relato científico que relacione casos de infertilidade ao uso da pílula anticoncepcional.

A confusão ocorre muito por conta do período que a mulher decide parar de tomar a substância para engravidar. Geralmente, entre seus 30 e 35 anos.

Nessa fase da vida, a produção dos folículos ovarianos, responsáveis pela produção dos óvulos femininos, tende a reduzir para menos da metade. 

Uma outra confusão se deve ao fato de que, no passado, após longo uso destes medicamentos com altas dosagens, as mulheres demoravam a voltar a menstruar pelo bloqueio hipotalâmico e hipofisário.

As pílulas atuam de várias formas neste processo de contracepção, sendo o principal através da inibição da secreção de gonadotrofinas por feedback negativo sobre o hipotálamo e hipófise, provocando inibição da ovulação ou secundariamente através do bloqueio do colo e do útero pelos progestágenos que os deixam inadequados à passagem do esperma e consequente implantação.

A primeira pílula aprovada foi em 1960 com dosagens muito altas (50 picogramas de 12/12hs), era de 3 a 6,5 vezes mais forte que as mais utilizadas nos dias de hoje (35, 30, 20 e 15 picogramas).

Apresentavam benefícios na qualidade de vida e proteção contra câncer de ovário e endométrio, apesar do aumento de câncer de mama, trombose venosa profunda e derrame decorrente de suas altas dosagens.

Planejamento familiar é um direito garantido por lei, cujo conjunto de ações e serviços tem como finalidade, contribuir para a saúde da mulher, da família e da criança, ao considerar o número de filhos que uma mulher deseja ter, a opção de não ter filhos, bem como a idade em que ela deseja tê-los com o devido espaçamento desejado entre eles.

Os benefícios do planejamento familiar são: 

  • Redução da mortalidade materna 
  • Redução da gravidez na adolescência
  • Aumento do intervalo entre as gestações
  • Redução do número de abortamentos 
  • Melhoria das relações familiares 
  • Melhora da vida sexual e a melhora no trabalho.

Paralelo ao surgimento da pílula em 1960, as mulheres iniciaram uma revolução silenciosa e discreta com redução da taxa de fecundidade brasileira de 6,3 filhos em 1960 para 2,3 filhos no início do século em 2000 e 1,95 filhos em 2007, segundo dados do Instituto de Geografia e Estatistica (IBGE)

Na década de 70 a população brasileira estimada era de 93 milhões com 28,8% das mulheres economicamente ativas,e com o número de brasileiros em 2007 igual a 184 milhões com 43,6% das mulheres economicamente ativas.

No Brasil, em um estudo de 2015, 79% das mulheres em idade fértil utilizam algum método contraceptivo como planejamento familiar, representando um índice 28% maior do que o registrado em 1970, com predomínio da contracepção hormonal reversível. 

O Brasil apresentou elevada queda de fecundidade nas últimas décadas como vimos; no entanto, diferenças sociodemográficas ainda impactam diretamente no acesso ao planejamento reprodutivo no país. 

Os métodos de contracepção são divididos em:

  • Método comportamental:
  • Barreira mecânica;
  • Barreira química;
  • Impeditivo da nidação:
  • Hormonal e cirúrgico.

De acordo com estudo transversal de 2019 (Trindade e col) que utilizou dados secundários de 17.809 mulheres que responderam à pesquisa nacional de saúde, mais de 80% das mulheres relataram utilizar algum método contraceptivo, sendo o contraceptivo oral o mais utilizado (34,2%), seguido dos cirúrgicos (25,9%) e das camisinhas (14,5%).  

As mulheres pretas/pardas, nortistas e com baixa escolaridade são mais esterilizadas, enquanto as brancas, com maior escolaridade e das Regiões Sul e Sudeste são as que mais utilizam contraceptivo oral e dupla proteção. 

Apesar das melhorias observadas, não houve diminuição da prevalência do não uso de método contraceptivo e ainda existem desigualdades de acesso à contracepção no país.

Mais de 106 milhões de mulheres do mundo inteiro estão usando o DIU, que é o segundo método de planejamento familiar mais comumente usado, logo após a esterilização voluntária feminina, sendo, porém, o mais usado entre os métodos reversíveis. As altas taxas de uso são provocadas pela China, onde vivem cerca de dois terços das usuárias de DIU do mundo.  

Uso ACO (contraceptivo hormonal oral – medicamento anticoncepcional) tem mais de 100 milhões de mulheres no mundo (35% no Brasil,  25% GRÃ-BRETANHA E 1% JAPÃO) mostrando o peso da cultura nesta tomada de decisão.

O DIU não hormonal não traz alguns dos muitos benefícios contraceptivos, como o controle do ciclo, a melhora da cólica menstrual, a diminuição do fluxo menstrual, a diminuição das dores nas mama, a melhora da tensão pré- menstrual, a proteção contra câncer de ovário e endométrio, a diminuição dos cistos funcionais do ovário, a prevenção da endometriose e miomas, a proteção da fertilidade, a melhora da pele, da acne e do hirsutismo.

Como fica a fertilidade depois de usar anticoncepcional por muito tempo?

Segundo um estudo publicado na revista Human Reproduction, se você usou anticoncepcionais orais por mais de quatro anos, não precisa se preocupar. 

Você tem mais chances de engravidar dentro do período de um ano do que mulheres que tomaram anticoncepcionais por um período de dois anos. Se o uso foi superior a 12 anos, as chances de engravidar são ainda maiores.

As pílulas são classificadas em combinadas (com estrogênio e progesterona) e apenas com progestogênio, também chamadas de minipílulas.

As combinadas dividem-se ainda em monofásicas, bifásicas e trifásicas. 

Nas monofásicas, a dose dos esteróides é constante durante toda a cartela. As bifásicas contêm duas dosagens diferentes e as trifásicas (três dosagens), tentando ser parecido com o ciclo hormonal natural.

A pílula oral é feita de hormônios parecidos com os produzidos pelo corpo: estrogênio sintético e natural e progesterona. 

O etinilestradiol (EE) é o estrogênio sintético mais utilizado com dosagens que podem ser de 50, 35, 30, 20 ou 15 picogramas,  diferente do 17 beta estradiol que é bioidêntico presente em apenas dois contraceptivos comercializados no Brasil.

Os progestágenos podem ser derivados da 17-OH-progesterona  –  pregnanos, da 19-nor-testosterona e da espironolactona que vão conferir determinados benefícios ou malefícios ,como melhora da pele, inchaço, trombose,… 

As eficácias são semelhantes, como podemos ver de acordo com o índice de Pearl.

  • Contraceptivo oral (0,1 a 3,0 falhas/100 mulheres-ano);
  • Injetáveis (< 1,0 falhas/100 mulheres-ano);
  • Implante (< 1,0 falhas/100 mulheres-ano);
  • Minipílula (1,1 a 9,6 falhas/100 mulheres-ano).

Certos medicamentos interferem com os contraceptivos hormonais, como os antibióticos, rifampicina e griseofulvina, os anticonvulsivantes como fenobarbital, hidantoína, carbamazepina e primidona.

Sofrem interferência dos contraceptivos hormonais os anticoagulantes, benzodiazepínicos, ácido fólico, imipramina e  insulina.

A forma como o hormônio é liberado, pode ser através da via oral, parenteral (intramuscular), subcutânea (adesivos, implantes), vaginal (anéis) e uterina ( DIU medicado).

A decisão entre qual método utilizar depende da avaliação da paciente que precisa responder junto ao seu médico a três perguntas. Qual método ela pretende usar? O histórico e a saúde dela permitem o uso?  E, por último e, não menos importante, ela consegue se adaptar ao mesmo? Essa última pergunta deve ser respondida após um período de avaliação não inferior a 90 dias, com exceção para o implante e o DIU.

Gustavo Safe é diretor e médico especialista em endometriose no Centro Avançado em Endometriose e preservação da fertilidade, Clínica Ovular fertilidade e menopausa e Instituto Safe. Estudioso dos assuntos relacionados à saúde da mulher com enfoque na dor pélvica, infertilidade, preservação da fertilidade, endometriose, endoscopia ginecológica e cirurgias minimamente invasivas.

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Incontinência urinária é duas vezes mais comum em mulheres

Incontinência urinária é duas vezes mais comum em mulheres

(Idosas são mais acometidas por incontinência urinária / foto: pixabay)

Incontinência urinária é duas vezes mais comum em mulheres

Pandemia agravou tratamento de várias doenças, como a incontinência urinária, ao dificultar acesso da população a exames diagnósticos e tratamentos

De acordo com a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), a incontinência urinária (os escapes de urina) são duas vezes mais comuns no público feminino (devido à anatomia do sistema genital ), atingindo 40% das gestantes e cerca de 35% das mulheres com mais de 40 anos ou após a menopausa, mostrando ser a idade e a gestação os principais fatores de risco. 

No Brasil, ela afeta a vida de mais de 10 milhões de pessoas e, no mundo, aproximadamente 5% da população

Números divulgados pelo Ministério da Saúde indicam que os tratamentos cirúrgicos para a incontinência urinária caíram 60% em 2020, em relação ao ano de 2019.

Com o avanço da vacinação, as pessoas estão retornando à busca por  tratamento especializado.

Para que as mulheres mantenham uma capacidade adequada de continência urinária, é necessário que diversos músculos, nervos (simpáticos, parassimpáticos e somáticos) atuem de forma harmônica.

A bexiga funciona como reservatório para armazenamento e eliminação periódica da urina. A bexiga é um órgão muscular oco, constituído por fibras musculares lisas que formam feixes sem orientação definida.

Para que essas funções ocorram adequadamente, é necessário que o músculo da bexiga (detrusor) relaxe e haja aumento coordenado do tônus esfincteriano uretral durante a fase de enchimento da bexiga, e o oposto durante a micção.

A incontinência urinária é caracterizada pela perda involuntária da urina e, apesar de não colocar em risco a vida de quem sofre, tem um impacto negativo em todas as dimensões da qualidade de vida (social, psicológica, física, sexual), desencadeando fenômenos de depressão, redução da autoestima e constrangimento social

É importante saber que nem toda incontinência urinária é igual. Ou seja, existem vários tipos e causas diferentes, sendo a incontinência diferente em homens, mulheres, crianças e idosos. O grau do vazamento involuntário de urina também varia de um indivíduo para outro, podendo ser:

  • Leve: quando os escapes ocorrem ocasionalmente e em pequena quantidade.
  • Moderado: a perda de urina acontece frequentemente e em quantidade moderada. Nesse caso, já é preciso utilizar algum forro ou produtos para barrar o incômodo.
  • Intenso: os escapes são frequentes e em grande quantidade, capazes de gerar vazamentos. Essa situação pode gerar grande constrangimento e, sem o uso de produtos adequados, prejudica a vida pessoal e social.

A incontinência por esforço é causado por uma disfunção do sistema esfincteriano da bexiga. Esta complicação provoca a incapacidade da bexiga de suportar aumentos repentinos na pressão intra-abdominal e a manifestação mais evidente é a incapacidade de reter a urina em caso de espirros, risos, saltos, esforço físico (como levantar peso), durante relações sexuais etc.

A incontinência de urgência é a perda não controlada de urina que ocorre por uma necessidade urgente e incontrolável de fazer xixi. A noctúria (acordar à noite para urinar) e incontinência noturna são fenômenos comuns. Esse tipo de incontinência geralmente é causado pela bexiga hiperativa; mas também pode ser causado por infecção urinária ou alteração dos nervos que ficam na base da bexiga.

A incontinência mista associa os dois tipos citados acima. 

Menos frequente, temos as perdas de urina decorrente de fístulas (após cirurgias, radioterapia,…) e transbordamento em casos de bexiga neurogênica.

A incontinência pode acontecer por várias razões, como por infecções do trato urinário, infecção vaginal, irritação e constipação, uso de medicamentos e, em especial, anormalidades como:

  • Músculos fracos da bexiga;
  • Bexiga hiperativa;
  • Fraqueza e disfunções do assoalho pélvico;
  • Danos nos nervos que controlam a bexiga;
  • Doenças como esclerose múltipla, diabetes ou Parkinson;
  • Tumores (benignos ou malignos);
  • Prolapso de órgão pélvico, quando ocorrer relaxamento e queda da bexiga ou uretra, por exemplo;
  • Lesão ou dano aos nervos ou músculos durante uma cirurgia.

O assoalho pélvico ou piso pélvico, como o próprio nome indica, é um grupo de músculos voluntários e involuntários e ligamentos conectados a estruturas ósseas que se fundem e sustentam os órgãos abdominais e pélvicos. 

Essa estrutura participa de várias funções do organismo e se conecta a outros grupos musculares do abdômen, das costas e das pernas. Ele forma o períneo e por ele passam ou se sustentam a uretra (canal da urina), a vagina, o útero, o reto e o ânus, podendo impactar a função urinária, sexual e intestinal/fecal.

Evoluímos muito nos últimos 50 anos na compreensão da função urinária e do assoalho pélvico e, atualmente, sabemos que a perda urinária (incontinência) aos esforços, tão frequente nas mulheres, se deve a um enfraquecimento do ligamento pubouretral e do músculo de mesmo nome. Estes estudos mudaram o tratamento cirúrgico da incontinência urinária de esforço, tornando-o um procedimento minimamente invasivo.

Muito se falou nos últimos anos em flacidez vaginal, que leva à incontinência urinária e fecal, ao prolapso genital, também conhecido por prolapso vaginal, quando os músculos que suportam os órgãos femininos na pelve enfraquecem, fazendo com que o útero, uretra, bexiga e reto desçam pela vagina, podendo mesmo sair para o exterior.

Não basta ter só força muscular, mas função muscular adequada e equilíbrio.

É um equilíbrio delicado, que necessita de uma abordagem multidisciplinar, envolvendo ginecologistas, urologistas, coloproctologistas e fisioterapeutas. 

A fisioterapia especializada trabalha não só a força muscular, mas coordenação e relaxamento, e tem como meta devolver a função de trabalhar preventivamente nas épocas em que o assoalho pélvico pode entrar em sofrimento, como gravidez, parto e pós-parto.

De acordo com uma pesquisa da Organização Mundial da Saúde (OMS), o uso de cesariana continua crescendo mundialmente, respondendo agora por mais de um em cada cinco (21%) partos. Este número deve continuar aumentando na próxima década, com quase um terço (29%) de todos os partos, provavelmente ocorrendo tal previsão de resolução dos por cesariana até 2030.

Em 2018, um estudo publicado na revista científica Lancet comparou a taxa de cesáreas em diferentes países. O Brasil ficou atrás apenas da República Dominicana. 

As cesáreas, realizadas tanto pelos serviços privados como pelos públicos, representavam 55,5% do total de partos no país. 

O parto normal pode provocar incontinência urinária devido aos danos que pode provocar à integridade da musculatura e inervação do assoalho pélvico, muito importantes para a manutenção da continência urinária. 

No entanto, isso não significa que todas as mulheres que têm um parto normal, venham a sofrer deste problema. Os fatores que podem aumentar o risco de desenvolver incontinência urinária são o parto prolongado, trabalho de parto (induzido) e o tipo de parto, segundo alguns trabalhos:

– Parto normal aumenta risco (0R=1,5 a 3);

– Uso de fórcipes aumenta muito o risco (OR=35);

– Parto cesáreo protege (OR=0,39).

Esses parâmetros do parto vaginal relacionados à incontinência urinária foram estudados no estudo norueguês EPICONT, que incluiu 11.397 mulheres em um questionário sobre incontinência urinária e variáveis relacionadas ao parto com associação significante entre qualquer tipo de incontinência urinária e peso do recém-nascido maior que 4 kg.

A atividade física pode “evidenciar” a incontinência urinária, passando esta a ser percebida apenas a partir da realização de atividades físicas que predisponham a perda de urina, mesmo em mulheres que não têm fatores de risco como a idade e paridade.

A incontinência urinária pode ser provocada por esportes de alto impacto como musculação, crossfit, vôlei, futebol e até mesmo corrida, podendo comprometer os mecanismos de sustentação, suspensão e contenção da musculatura pélvica, que sofre sobrecarga intensa e repetida, promovendo o enfraquecimento do assoalho pélvico. “Durante essas atividades, que geralmente envolvem saltos e contração muscular, os órgãos internos causam muita pressão sobre a bexiga”.

No entanto, existem exercícios que podem ajudar as mulheres a fortalecer a musculatura pélvica, como os criados pelo médico Arnold Kegel na década de 1950  e as técnicas de pompoarismo.

O tratamento da incontinência urinária depende muito do tipo e do grau da doença. Existem tratamentos cirúrgicos, medicamentosos e fisioterapêuticos – cada um indicado para determinado tipo e grau do problema. 

Cirurgia de Sling – para mulheres (visa restaurar o suporte da bexiga e da uretra);

medicamentos: o urologista, após diagnosticar que a causa da incontinência urinária é hormonal, pode prescrever medicamentos como anticolinérgicos e estrogênio tópico;

Cinesioterapia do assoalho pélvico: reeducação pélvica para fortalecer os músculos pélvicos através de exercícios físicos específicos (conhecido como exercícios de Kegel);

Estimulação elétrica: uso de equipamentos elétricos para estimulação passiva. Este tratamento é feito com um fisioterapeuta por recomendação médica. 

É importante ressaltar que esses tratamentos não garantem a cura da incontinência urinária. Além disso, complicações podem ocorrer; por isso, é importante nunca se automedicar ou fazer qualquer procedimento sem supervisão médica. 

Hábitos como segurar o xixi, não beber água, fazer xixi a toda hora, consumir substâncias em excesso, como carboidratos, açúcar, álcool e cigarro devem ser evitados.

Gustavo Safe é diretor e médico especialista em endometriose no Centro Avançado em Endometriose e preservação da fertilidade, Clínica Ovular fertilidade e menopausa e Instituto Safe. Estudioso dos assuntos relacionados à saúde da mulher com enfoque na dor pélvica, infertilidade, preservação da fertilidade, endometriose, endoscopia ginecológica e cirurgias minimamente invasivas.

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