A menopausa e os seus desafetos
A menopausa tem impactos profundos na qualidade de vida das mulheres (foto: Marcus Aurelius / Pexels)
A menopausa é um ponto, uma data (a última menstruação) que representa um período nada fácil para a mulher onde a conjunção de fatores emocionais e físicos acabam afetando o equilíbrio.
Imagine uma mulher que sabe o que quer, chega aos 50 anos bem estabelecida profissionalmente e financeiramente com responsabilidades, com filhos no final da adolescência ou saindo de casa, pais ausentes ou com a saúde debilitada, correria do dia a dia tentando conciliar o social, a casa, o marido e de repente você fica completamente sem estrogênio, sem energia, sem gás, com o tanque vazio!
No período pós menopausa cessa a secreção estrogênica oriunda do ovário, permanecendo a produção de androstenediona pela suprarrenal, que é transformada em estroma (estrogênio fraco) pelo tecido adiposo, músculo, fígado e cérebro para depois ser convertida parcialmente em estradiol (estrogênio forte).
A título de comparação, os valores do estradiol que variam de 40 a 250pg/ml durante o ciclo menstrual normal passam a ser de apenas 13pg/ml na pós menopausa, enquanto a estrona que no ciclo normal flutua entre 40 e 70pg/ml terá uma diminuição menor com valores de 30 pg/ml.
O ovário não pára completamente de funcionar após a menopausa, pois o estroma ovariano continua a produzir testosterona (exclusiva do ovário) que cai de 100ng/ml para 0,2ng/ml além da androstenediona que pode chegar a 2,26ng/ml cai a 0,9ng/ml na pós menopausa.
Esta queda importante de todos estes hormônios esteroides é responsável por repercussões como ondas de calor, secura vaginal, disfunção sexual, depressão, risco aumentado de osteoporose, demência, problemas cardiovasculares, entre outros.
Quando observamos a pirâmide etária do Brasil e de Minas Gerais (MG) percebemos que a população está envelhecendo se confrontarmos os dados de 2016 (13,5% de idosos em MG e 12,1% no Brasil) com as estimativas de 2030 (17,8% de idosos em MG e 16,7% no Brasil).
Acredito na importância desta transição menopausal para as mulheres que acabam passando metade da vida neste período de climatério e senilidade.
As candidatas à terapia de reposição hormonal (TRH) são mulheres saudáveis, sintomáticas nos primeiros 10 anos da pós menopausa e/ou com menos de 60 anos e que não têm contraindicações como suspeita ou confirmação de câncer de mama, suspeita ou confirmação de tumor dependente de estrogênio, sangramento genital anormal de etiologia desconhecida, doença hepática ativa e antecedente de trombose e embolia venosa.
Na prática não é simples assim, pois a maior parte das mulheres que se encaixam neste perfil acabam não fazendo a TRH por questões pessoais, culturais ou sociais.
O primeiro desafio da TRH consiste na dificuldade das mulheres identificarem essa necessidade de reposição, pois os sintomas se instalam de forma gradativa neste período de transição, conhecido como a perimenopausa, que é o final do período reprodutivo caracterizado por irregularidade no ciclo menstrual que começa 2 a 5 anos antes da menopausa e se estende até um ano após.
Neste período, as mulheres podem apresentar ciclos curtos com menos de 25 dias ou ciclos longos com mais de 35 dias associado a sintomas menopausais apesar de não estarem ainda com queda importante do estrogênio.
O uso de hormônios (progesterona) isolados ou não com objetivo de regularizar o ciclo menstrual e proteger a paciente está bem indicado, mas é pouco utilizado na prática clínica.
As obesas têm a produção elevada de estrona a partir da aromatização periférica no tecido adiposo, com menor produção hepática da globulina ligadora de esteróides sexuais (SHBG) levando a uma maior proporção de estradiol na forma livre com maiores níveis séricos absolutos de estradiol e estrona.
Estas pacientes apresentam assim menos efeitos da falta do estrogênica, com menos sintomas e menos risco de osteoporose apesar de serem mais propensas ao câncer de endométrio devido ao estímulo de estrogênio sem oposição da progesterona.
A TRH é hoje reconhecida como o tratamento mais eficaz para redução ou eliminação dos sintomas do climatério, proteção óssea e cardiovascular, quando bem indicada e individualizada.
Leia também: A ciência dos fito-hormônios no tratamento dos sintomas climatéricos
O Segundo desafio consiste em melhorar os sintomas e ao mesmo tempo gerar proteção sem aumentar o risco com a menor dose possível de estrogênio e pelo menor tempo possível.
Os fogachos afetam até 75% das mulheres na perimenopausa e persistem por um a dois anos após a menopausa com apenas 5% que manterão os sintomas cinco anos depois.
São caracterizados por ondas de calor de início repentino, geralmente na cabeça, pescoço ou tórax, que pode ser acompanhado de rubor, sudorese e calafrios, aumento da temperatura corporal, vasodilatação periférica e aumento transitório dos batimentos cardíacos.
Eles são muitas vezes os principais responsáveis pela perda da qualidade de vida da mulher que, através de um ciclo vicioso, não consegue dormir, trabalhar e ter uma vida social satisfatória, levando a quadros de depressão e ansiedade.
Pacientes que não são candidatas a TRH podem usar medicações como a Clonidina ou antidepressivos como a Paroxetina, Venlafaxina e a Gabapentina no combate aos fogachos.
Outro sintoma importante é a atrofia, onde a ausência de estrogênio faz com que o tecido vulvar e vaginal se retraia, suas paredes tornam-se finas e secas e as dobras desaparecem, provocando ressecamento e prurido vaginal, dor na relação sexual, dor e urgência urinária.
Manifestam-se em média três anos após a menopausa em 15% a 38% das mulheres acima de 55 anos.
O tratamento pode ser com estrogenioterapia tópica através de cremes, comprimido, ou apenas sintomáticos como hidratantes e lubrificantes.
O laser vaginal e vulvar tem se tornado uma ferramenta importante, principalmente em pacientes com passado ou risco aumentado de câncer que não podem fazer TRH.
A osteoporose é um distúrbio esquelético que compromete a resistência dos ossos em razão da redução progressiva na massa óssea com maior risco de fratura.
A osteopenia é a precursora da osteoporose e já demanda atenção por parte da paciente e do médico quando presente nos primeiros anos da pós menopausa.
A densitometria óssea é o exame responsável pelo diagnóstico devendo ser realizado a partir dos 65 anos em pacientes sem risco e entre 50 e 69 anos nas mulheres com risco.
Além da TRH, as mulheres podem se beneficiar do uso dos Bifosfonatos, Alendronato, Risedronato, Ibandronato, Raloxifeno, Calcitonina e a Teriparatida (PTH recombinante).
A disfunção sexual ou o menor interesse ou desejo de iniciar a atividade sexual, a redução da excitação ou da capacidade de atingir o orgasmo durante as relações sexuais tem causa multifatorial podendo ser agravada neste período.
Um correto controle da depressão, um aconselhamento conjugal, uma terapia sexual e um tratamento da atrofia genitourinária são importantes nesta abordagem.
A terapia androgênica em mulheres com baixos níveis de androgênios sem outras causas identificáveis de problema sexual pode ser útil após uma seleção correta das candidatas
A doença cardiovascular (DCV) é a principal causa de morte em mulheres, sendo responsável por aproximadamente 45% da mortalidade agravada pelo tabagismo, sedentarismo, obesidade entre outros.
A TRH reduz os níveis de colesterol total e LDL, aumenta os níveis de HDL, diminui níveis séricos de lipoproteínas responsáveis pela aterosclerose além de reduzir a resistência à insulina favorecendo o controle da glicose.
Menos de 20 anos depois do início da TRH, ela foi colocada em xeque pela Women’s Health Initiative (WHI), pois em algumas de suas pesquisas, o WHI alertava para os riscos de doença arterial coronariana, acidente vascular cerebral, assim como trombose e câncer de mama associados à TRH, afirmando que os riscos eram, em muitos casos, superiores aos benefícios de alívio dos sintomas relacionados ao climatério.
A TRH deve ser suspensa assim que os benefícios por ela gerados não forem mais necessários ou a partir do momento em que a relação benefício versus risco, se torna desvantajosa, gerando um terceiro desafio.
Como suspender a TRH nas pacientes com 10 anos de uso ou com mais de 60 anos que estão cada vez mais ativas (geração prateada) e sem desejo de apresentar muitos dos sintomas que foram postergados.
Estas pacientes podem assinar um contrato de risco com elas mesmas e continuar a utilizar a TRH com um controle médico rigoroso, pois não há uma definição de duração máxima obrigatória ou idade máxima na qual esta deva ser suspensa.
O quarto desafio é o risco de câncer de mama associado a uso de TRH que é real, com incidência anual de menos de 1 caso por 1.000 mulheres com incremento com regime terapêutico estroprogestativo após cinco anos de uso.
Os dados existentes não permitem afirmar diferenças quanto ao risco conforme o tipo, a dose e as vias de administração.
A TRH combinada tem efeito protetor na incidência de câncer colorretal e não se associa a aumento no risco de neoplasias da tireoide, tumores de pele melanoma e não melanoma, tumores hepático, renal e nas doenças hematológicas malignas.
O quinto e último desafio é adequar a TRH (dose, o regime, a via de admnistração, o tipo de medicação) às necessidades das pacientes como o aumento da libido, a diminuição do inchaço corporal, a melhora da pele, o correto equilíbrio da pressão arterial e do diabetes, a diminuição ou manutenção da gordura abdominal e o risco de trombose.
A Terapia hormonal bioidêntica é aquela realizada com hormônios com estrutura química idêntica à observada naqueles naturalmente produzidos pelas mulheres não havendo evidências científicas suficientes para sugerir e apoiar as alegações de que as manipulações dos denominados “hormônios bioidênticos”, sendo importante a consulta com especialistas.
Gustavo Safe é diretor e médico especialista em endometriose no Centro Avançado em Endometriose e preservação da fertilidade, Clínica Ovular fertilidade e menopausa e Instituto Safe. Estudioso dos assuntos relacionados à saúde da mulher com enfoque na dor pélvica, infertilidade, preservação da fertilidade, endometriose, endoscopia ginecológica e cirurgias minimamente invasivas.
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