(Idosas são mais acometidas por incontinência urinária / foto: pixabay)
Incontinência urinária é duas vezes mais comum em mulheres
Pandemia agravou tratamento de várias doenças, como a incontinência urinária, ao dificultar acesso da população a exames diagnósticos e tratamentos
De acordo com a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), a incontinência urinária (os escapes de urina) são duas vezes mais comuns no público feminino (devido à anatomia do sistema genital ), atingindo 40% das gestantes e cerca de 35% das mulheres com mais de 40 anos ou após a menopausa, mostrando ser a idade e a gestação os principais fatores de risco.
No Brasil, ela afeta a vida de mais de 10 milhões de pessoas e, no mundo, aproximadamente 5% da população.
Números divulgados pelo Ministério da Saúde indicam que os tratamentos cirúrgicos para a incontinência urinária caíram 60% em 2020, em relação ao ano de 2019.
Com o avanço da vacinação, as pessoas estão retornando à busca por tratamento especializado.
Para que as mulheres mantenham uma capacidade adequada de continência urinária, é necessário que diversos músculos, nervos (simpáticos, parassimpáticos e somáticos) atuem de forma harmônica.
A bexiga funciona como reservatório para armazenamento e eliminação periódica da urina. A bexiga é um órgão muscular oco, constituído por fibras musculares lisas que formam feixes sem orientação definida.
Para que essas funções ocorram adequadamente, é necessário que o músculo da bexiga (detrusor) relaxe e haja aumento coordenado do tônus esfincteriano uretral durante a fase de enchimento da bexiga, e o oposto durante a micção.
A incontinência urinária é caracterizada pela perda involuntária da urina e, apesar de não colocar em risco a vida de quem sofre, tem um impacto negativo em todas as dimensões da qualidade de vida (social, psicológica, física, sexual), desencadeando fenômenos de depressão, redução da autoestima e constrangimento social.
É importante saber que nem toda incontinência urinária é igual. Ou seja, existem vários tipos e causas diferentes, sendo a incontinência diferente em homens, mulheres, crianças e idosos. O grau do vazamento involuntário de urina também varia de um indivíduo para outro, podendo ser:
- Leve: quando os escapes ocorrem ocasionalmente e em pequena quantidade.
- Moderado: a perda de urina acontece frequentemente e em quantidade moderada. Nesse caso, já é preciso utilizar algum forro ou produtos para barrar o incômodo.
- Intenso: os escapes são frequentes e em grande quantidade, capazes de gerar vazamentos. Essa situação pode gerar grande constrangimento e, sem o uso de produtos adequados, prejudica a vida pessoal e social.
A incontinência por esforço é causado por uma disfunção do sistema esfincteriano da bexiga. Esta complicação provoca a incapacidade da bexiga de suportar aumentos repentinos na pressão intra-abdominal e a manifestação mais evidente é a incapacidade de reter a urina em caso de espirros, risos, saltos, esforço físico (como levantar peso), durante relações sexuais etc.
A incontinência de urgência é a perda não controlada de urina que ocorre por uma necessidade urgente e incontrolável de fazer xixi. A noctúria (acordar à noite para urinar) e incontinência noturna são fenômenos comuns. Esse tipo de incontinência geralmente é causado pela bexiga hiperativa; mas também pode ser causado por infecção urinária ou alteração dos nervos que ficam na base da bexiga.
A incontinência mista associa os dois tipos citados acima.
Menos frequente, temos as perdas de urina decorrente de fístulas (após cirurgias, radioterapia,…) e transbordamento em casos de bexiga neurogênica.
A incontinência pode acontecer por várias razões, como por infecções do trato urinário, infecção vaginal, irritação e constipação, uso de medicamentos e, em especial, anormalidades como:
- Músculos fracos da bexiga;
- Bexiga hiperativa;
- Fraqueza e disfunções do assoalho pélvico;
- Danos nos nervos que controlam a bexiga;
- Doenças como esclerose múltipla, diabetes ou Parkinson;
- Tumores (benignos ou malignos);
- Prolapso de órgão pélvico, quando ocorrer relaxamento e queda da bexiga ou uretra, por exemplo;
- Lesão ou dano aos nervos ou músculos durante uma cirurgia.
O assoalho pélvico ou piso pélvico, como o próprio nome indica, é um grupo de músculos voluntários e involuntários e ligamentos conectados a estruturas ósseas que se fundem e sustentam os órgãos abdominais e pélvicos.
Essa estrutura participa de várias funções do organismo e se conecta a outros grupos musculares do abdômen, das costas e das pernas. Ele forma o períneo e por ele passam ou se sustentam a uretra (canal da urina), a vagina, o útero, o reto e o ânus, podendo impactar a função urinária, sexual e intestinal/fecal.
Evoluímos muito nos últimos 50 anos na compreensão da função urinária e do assoalho pélvico e, atualmente, sabemos que a perda urinária (incontinência) aos esforços, tão frequente nas mulheres, se deve a um enfraquecimento do ligamento pubouretral e do músculo de mesmo nome. Estes estudos mudaram o tratamento cirúrgico da incontinência urinária de esforço, tornando-o um procedimento minimamente invasivo.
Muito se falou nos últimos anos em flacidez vaginal, que leva à incontinência urinária e fecal, ao prolapso genital, também conhecido por prolapso vaginal, quando os músculos que suportam os órgãos femininos na pelve enfraquecem, fazendo com que o útero, uretra, bexiga e reto desçam pela vagina, podendo mesmo sair para o exterior.
Não basta ter só força muscular, mas função muscular adequada e equilíbrio.
É um equilíbrio delicado, que necessita de uma abordagem multidisciplinar, envolvendo ginecologistas, urologistas, coloproctologistas e fisioterapeutas.
A fisioterapia especializada trabalha não só a força muscular, mas coordenação e relaxamento, e tem como meta devolver a função de trabalhar preventivamente nas épocas em que o assoalho pélvico pode entrar em sofrimento, como gravidez, parto e pós-parto.
De acordo com uma pesquisa da Organização Mundial da Saúde (OMS), o uso de cesariana continua crescendo mundialmente, respondendo agora por mais de um em cada cinco (21%) partos. Este número deve continuar aumentando na próxima década, com quase um terço (29%) de todos os partos, provavelmente ocorrendo tal previsão de resolução dos por cesariana até 2030.
Em 2018, um estudo publicado na revista científica Lancet comparou a taxa de cesáreas em diferentes países. O Brasil ficou atrás apenas da República Dominicana.
As cesáreas, realizadas tanto pelos serviços privados como pelos públicos, representavam 55,5% do total de partos no país.
O parto normal pode provocar incontinência urinária devido aos danos que pode provocar à integridade da musculatura e inervação do assoalho pélvico, muito importantes para a manutenção da continência urinária.
No entanto, isso não significa que todas as mulheres que têm um parto normal, venham a sofrer deste problema. Os fatores que podem aumentar o risco de desenvolver incontinência urinária são o parto prolongado, trabalho de parto (induzido) e o tipo de parto, segundo alguns trabalhos:
– Parto normal aumenta risco (0R=1,5 a 3);
– Uso de fórcipes aumenta muito o risco (OR=35);
– Parto cesáreo protege (OR=0,39).
Esses parâmetros do parto vaginal relacionados à incontinência urinária foram estudados no estudo norueguês EPICONT, que incluiu 11.397 mulheres em um questionário sobre incontinência urinária e variáveis relacionadas ao parto com associação significante entre qualquer tipo de incontinência urinária e peso do recém-nascido maior que 4 kg.
A atividade física pode “evidenciar” a incontinência urinária, passando esta a ser percebida apenas a partir da realização de atividades físicas que predisponham a perda de urina, mesmo em mulheres que não têm fatores de risco como a idade e paridade.
A incontinência urinária pode ser provocada por esportes de alto impacto como musculação, crossfit, vôlei, futebol e até mesmo corrida, podendo comprometer os mecanismos de sustentação, suspensão e contenção da musculatura pélvica, que sofre sobrecarga intensa e repetida, promovendo o enfraquecimento do assoalho pélvico. “Durante essas atividades, que geralmente envolvem saltos e contração muscular, os órgãos internos causam muita pressão sobre a bexiga”.
No entanto, existem exercícios que podem ajudar as mulheres a fortalecer a musculatura pélvica, como os criados pelo médico Arnold Kegel na década de 1950 e as técnicas de pompoarismo.
O tratamento da incontinência urinária depende muito do tipo e do grau da doença. Existem tratamentos cirúrgicos, medicamentosos e fisioterapêuticos – cada um indicado para determinado tipo e grau do problema.
– Cirurgia de Sling – para mulheres (visa restaurar o suporte da bexiga e da uretra);
medicamentos: o urologista, após diagnosticar que a causa da incontinência urinária é hormonal, pode prescrever medicamentos como anticolinérgicos e estrogênio tópico;
– Cinesioterapia do assoalho pélvico: reeducação pélvica para fortalecer os músculos pélvicos através de exercícios físicos específicos (conhecido como exercícios de Kegel);
– Estimulação elétrica: uso de equipamentos elétricos para estimulação passiva. Este tratamento é feito com um fisioterapeuta por recomendação médica.
É importante ressaltar que esses tratamentos não garantem a cura da incontinência urinária. Além disso, complicações podem ocorrer; por isso, é importante nunca se automedicar ou fazer qualquer procedimento sem supervisão médica.
Hábitos como segurar o xixi, não beber água, fazer xixi a toda hora, consumir substâncias em excesso, como carboidratos, açúcar, álcool e cigarro devem ser evitados.
Gustavo Safe é diretor e médico especialista em endometriose no Centro Avançado em Endometriose e preservação da fertilidade, Clínica Ovular fertilidade e menopausa e Instituto Safe. Estudioso dos assuntos relacionados à saúde da mulher com enfoque na dor pélvica, infertilidade, preservação da fertilidade, endometriose, endoscopia ginecológica e cirurgias minimamente invasivas.
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