Resistência à insulina e síndrome metabólica, conhecer para prevenir

A resistência à insulina (RI) é o principal vilão da síndrome metabólica que deve ser encarada como um problema de saúde pública. 

A Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP) representa um dos problemas da RI que podem provocar infertilidade, gravidez de alto risco e problemas cardiovasculares ao longo da vida da mulher.

A resistência à insulina não é uma doença e sim uma condição que junto a hiperinsulinemia é responsável por manifestações clínicas decorrente da deterioração da resposta aos efeitos fisiológicos da insulina sobre o metabolismo da glicose, dos lipídeos e proteínas e do endotélio vascular. 

O termo RI não é fácil de ser definido, mas de uma forma simplista representa uma menor resposta biológica do que a esperada para uma dada concentração de insulina. 

O emprego mais frequente do termo RI se aplica ao metabolismo da glicose e para isto, dois parâmetros são considerados: o nível de glicose circulante no estado de equilíbrio dinâmico e as concentrações de insulina. 

Nos estágios iniciais da resistência à insulina, há um aumento compensatório das concentrações do hormônio. 

O excesso de insulina compensa a sua queda nos tecidos de maior resistência embora induza a um aumento nos tecidos com sensibilidade normal ou minimamente afetada. 

Assim, o aumento de algumas funções mediadas pela insulina, paralelamente à hipofunção de outras, resulta em manifestações clínicas e sequelas que constituem a síndrome de resistência à insulina.

Conceito histórico

Em 1923, Kylin descreveu a ocorrência conjunta de hipertensão, hiperglicemia e gota como uma síndrome. Subsequentemente, muitas outras anormalidades metabólicas foram associadas à mesma, incluindo obesidade, microalbuminúria e anormalidades na fibrinólise e na coagulação. 

Já em 1948, Himsworth demonstrou que pacientes com diabetes eram “invisíveis à insulina”, dividindo eles em sensíveis e insensíveis à insulina.

Em 1988, a Organização Mundial de Saúde propôs uma definição única para a síndrome, tendo escolhido denomina-la síndrome metabólica (SM), em detrimento dos termos mais conhecidos.

Não temos um conceito reconhecido internacionalmente, mas uma definição da síndrome deve incluir dois ou mais dos seguintes critérios:

  • Intolerância à glicose, ou Diabetes Mellitus;
  • Elevação da pressão arterial;
  • Hipertrigliceridemia e baixos níveis de colesterol HDL;
  • Resistência à insulina;
  • Obesidade central;
  • Hiperuricemia.

São problemas cada vez mais prevalentes que se multiplicam como uma bola de neve que não param de crescer mas precisam ser combatidos ou amenizados.

A prática regular de exercícios físicos aeróbicos (20 a 40 minutos, 3 vezes por semana), a adoção de dieta balanceada e a manutenção do peso ideal (IMC entre 20 e 25) evitam o aparecimento dos elementos da SM e constituem as primeiras medidas a serem adotadas.

Infelizmente fazer atividade física regular e ter uma dieta balanceada não garantem um IMC ideal, mas qualquer perda de peso, até mesmo 10% do peso corporal já são suficientes para reverter grande parte das alterações metabólicas.

Uma vez que sabemos que a RI é a principal causa do problema, me pergunto se o uso de alguma medicação capaz de atuar no receptor de insulina não seria a solução. 

A RI nos tecidos periféricos, sobretudo em músculos e no tecido adiposo, é um fator determinante na etiopatogenia do Diabetes sendo uma alteração primordial em 92% dos pacientes diabéticos. 

Neste caso, quando o problema principal é o risco herdado familiar de desenvolver o diabetes parece sensato a utilização de medicamentos que diminuem ou evitam este risco.

Infelizmente as medicações recomendadas apresentam efeitos colaterais e devem ser utilizadas por longos períodos e por isso muitas vezes evitadas.

Quais são os sintomas da resistência à insulina?

Adiciona-se ao fato de a resistência à insulina raramente provocar sintomas, salvo quando esse desequilíbrio for muito grande, aparecendo um tipo de doença de pele caracterizado por pigmentações marrons, parecidas com sujeiras, em especial na região do pescoço (Acantose Nigricans).

A RI pode ser uma anormalidade no pré-receptor, receptor ou pós-receptor. 

A insulina exerce suas funções conjuntamente com o IGF-I e o fosfatidilinositol quinase 3 nos receptores celulares que determina a ativação de algumas enzimas e a inativação de outras.

Em uma segunda etapa, seja por disfunção, seja por superação da capacidade normal das células beta, ocorre redução da secreção pancreática de insulina. 

Tal fato manifesta-se inicialmente como intolerância à glicose com aumento da glicemia pós-prandial e, em seguida, no jejum, à medida que a insuficiência progride rumo ao Diabetes Mellitus.

A tendência genética, a obesidade, o aumento da gordura visceral abdominal e a dieta são os principais fatores no desenvolvimento do RI.

Dentre os fatores que influenciam a ação da insulina, o peso corporal é responsável por 30% da ação da insulina em indivíduos normais independente do IMC.

O condicionamento físico (VO2max.:) também apresenta uma forte correlação entre sua redução (VO2max baixo) e uma queda na sensibilidade à insulina, sendo responsável por 10 a 15% da ação da insulina em pessoas normais. 

Já o baixo peso no nascimento e no 1o ano de vida também estão relacionados ao desenvolvimento subsequente de RI.

A proteína do fígado SHBG, que transporta a testosterona, determinando o nível da forma livre ou biologicamente ativa do hormônio, é um marcador do estado androgênico na mulher e se correlaciona diretamente com a sensibilidade à insulina e negativamente com a insulina plasmática. 

O oposto ocorre no homem onde os níveis baixos de testosterona estão associados com obesidade abdominal, tendo-se demonstrado que a quantidade de gordura intra-abdominal correlaciona-se intensa e negativamente com os níveis plasmáticos de testosterona total e livre. 

Paradoxalmente, o excesso de testosterona nos homens pode também causar RI. 

A dieta com porcentagens elevadas de gordura saturada aumentam a adiposidade com o passar do tempo.

Os adoçantes podem favorecer o quadro de RI com ganho de gordura no fígado, aumento de peso e a instalação de um quadro inflamatório.

Com o envelhecimento há um pequeno aumento na adiposidade na região abdominal, sendo de cerca de 4 kg em indivíduos não obesos e 15 kg naqueles obesos com risco desenvolver diabetes melittus.

A hereditariedade influencia em 25 a 50% a ação da insulina em parentes de primeiro grau de diabéticos do tipo 2. 

Estudos em gêmeos idênticos mostraram que o fenótipo de intolerância à glicose tem uma influência genética de 61% enquanto o ambiental (estilo de vida) de  39%, ao passo que o diabetes do tipo 2 tem uma influência genética de 26% e ambiental de 74%.

Entre os diversos diabetogenes descritos, os seguintes teriam um papel significativo na RI: 

  • Substrato-1 do receptor de insulina (SRI-1: insulin receptor substrate-1). Descreveu-se uma mutação no códon 972 do SRI-1 que estaria associada com a RI e baixo peso ao nascer. 
  • Proteína ligante-2 de ácidos graxos (FABP-2: fatty acid binding protein-2), relacionada com a captação e transporte de ácidos graxos de cadeia longa.
  • Gene da síntese do glicogênio, que se verificou estar associado com a RI. 
  • Gene relacionado com a obesidade como o gene  que codifica a leptina, secretada pelos adipócitos.
  • Gene do receptor b-3 adrenérgico, que poderia ser um candidato para RI na obesidade visceral.

A Resistência à Insulina é um problema muito comum nas mulheres e está sempre associado a certas condições de saúde que dificultam saber quem veio primeiro: o ovo ou a galinha? Como exemplo temos a obesidade ou excesso de gordura na região da barriga,o sedentarismo, o ovário policístico (este distúrbio hormonal feminino pode provocar irregularidade menstrual, excesso de pelos, acne e obesidade), a esteatose hepática (trata-se de um acúmulo de gordura no fígado, que nos casos mais avançados pode causar dor, fraqueza e perda de apetite) e o diabetes tipo 2.

Como é realizado o diagnóstico?

O diagnóstico da RI pode ser feito através do Clamp Euglicêmico Hiperinsulinêmico, da Prova de Supressão da Insulina, do Teste de Tolerância à Glicose Endovenosa com Coletas Múltiplas com Modelo Matemático Mínimo, do Teste de Tolerância à Insulina e das medidas da glicemia e insulinemia basal como é feito o índice de HOMA IR e HOMA BETA que através de um cálculo fundamentado na dosagem em jejum da insulina e da glicose.

Uma vez realizado o diagnóstico de IR ou diante de critérios da Síndrome metabólica, medidas preventivas e não-farmacológicas como o exercício físico aeróbico, uma dieta pobre em gorduras e rica em fibras e carboidratos complexos pode melhorar a ação da insulina. 

A perda de peso induz a uma queda na pressão arterial (PA) uma vez que a cada 1% de queda no peso corporal há, em média, queda de 1 mmHg na pressão sistólica e de 2 mmHg na pressão diastólica. 

Terapia anti-hipertensiva, diminuição da ingestão de álcool, sal e gordura saturada também produzem queda da PA, independentemente do emagrecimento. 

A perda de peso também melhora o perfil lipídico. Uma perda de 10 kg pode acarretar queda de 10% no colesterol total, 15% no colesterol LDL, 30% nos triglicérides e aumento de 8% no colesterol HDL.

Para diminuir a incidência de doença microvascular (retinopatia, neuropatia e nefropatia), o controle glicêmico deve ser rigoroso. A queda do nível ideal de hemoglobina glicosilada em 1% está associada à redução na taxa de complicações em até 22%. 

As complicações macrovasculares (infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral e amputação) também diminui com o controle glicêmico rigoroso.

Em pacientes com síndrome metabólica, o anti-hiperglicemiante oral de primeira escolha é a Metformina que não leva ao ganho de peso e nem à hipoglicemia.

É o agente ideal para pacientes obesos e dislipidemicos  com funções renal e hepática normais.

Esse agente leva à diminuição na produção hepática de glicose e ao aumento da captação de glicose pelo músculo, reduzindo os valores da glicose em jejum com redução dos níveis de triglicérides e colesterol .

As sulfoniluréias estimulam a liberação pancreática de insulina, mas levam ao ganho de peso e a episódios de hipoglicemia. 

A insulina também pode ser usada para controlar os níveis glicêmicos. Efeitos indesejáveis do seu uso incluem ganho de peso e episódios de hipoglicemia mais comuns do que com o uso de sulfoniluréias.

As drogas supracitadas podem e devem ser associadas quando necessário, visando o melhor controle glicêmico. 

Inositol é um carboidrato encontrado em seu corpo, assim como em suplementos alimentares e dietéticos, eles são capazes de manter as células saudáveis, regular a concentração do íon cálcio dentro das células, ajudar no tratamento da diabetes, reduzir os níveis de colesterol no sangue, queimar as gorduras e ajudar no tratamento de algumas doenças.

O mio-inositol é uma isoforma do grupo do inositol que pertence ao complexo da vitamina B, um suplemento alimentar isento de efeitos colaterais nas doses recomendadas que atua a nível intra-celular facilitando a entrada da glicose na célula por um processo de sensibilização dos receptores de insulina.

Ele foi isolado por cientistas que começaram a utilizá-lo em pacientes  com SOP e RI. 89% das pacientes, após um período de 3 a 6 meses, apresentaram uma redução dos microcistos nos ovários com regulação do ciclo menstrual e ovulação.

Ele também atua nos neurotransmissores cerebrais, estimula a produção de serotonina podendo melhorar a ansiedade e a depressão.

O inositol é um composto promissor que com dose baixas de 4 gramas por dia é capaz de melhorar vários aspectos da função reprodutiva, regularizar o ciclo menstrual, ajudando no controle da diabetes gestacional e da síndrome metabólica.

Pesquisas futuras podem identificar outros efeitos importantes dessa molécula que está revolucionando o tratamento da RI.

A síndrome metabólica é uma afecção complexa. Seus múltiplos componentes, como diabetes, obesidade, hipertensão, dislipidemia, entre outros, são muitas vezes reconhecidos e tratados como doenças isoladas. 

A associação dos componentes deve ser reconhecida assim como as suas manifestações devem ser tratadas conjuntamente.

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Gustavo Safe é diretor e médico especialista em endometriose no Centro Avançado em Endometriose e preservação da fertilidade, Clínica Ovular Fertilidade e Menopausa e Instituto Safe. Estudioso dos assuntos relacionados à saúde da mulher com enfoque na dor pélvica, infertilidade, preservação da fertilidade, endometriose, endoscopia ginecológica e cirurgias minimamente invasivas.

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