Enxaqueca e cefaléia tensional, uma “dor de cabeça” para a mulher
Dor de cabeça e enxaqueca: entender as características de cada uma e saber descrevê-las ajuda o seu médico a definir a melhor prevenção, o controle, e prescrever o melhor tratamento
Você tem cefaléia (dor de cabeça) ou enxaqueca? Todo mundo terá, pelo menos, um episódio de dor de cabeça tensional durante a vida.
A enxaqueca, que também é chamada de migrânea, é um dos tipos de cefaléia.
A enxaqueca atinge 1 bilhão de pessoas no mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), e é a sexta doença crônica que mais incapacita pessoas.
No Brasil, 15% da população sofre da forma crônica, ou seja, com crises que duram pelo menos 15 dias por mês.
A cefaléia pode ser classificada em primária ou secundária, aguda ou crônica.
Cefaléias primárias são aquelas em que a dor de cabeça é a própria doença, como no caso da enxaqueca ou das dores de cabeça tensionais.
Cefaléias secundárias, por sua vez, são sintomas de outras alterações que estão acontecendo no nosso corpo, como as dores ocasionadas durante crises de sinusite ou desvio de septo, ATM, entre outras.
Apesar de existirem mais de 200 tipos de cefaléia, as mais frequentes na população mundial são a enxaqueca e a cefaléia tensional, também chamada de dor de cabeça comum, que respondem por mais de 90% das reclamações que chegam aos consultórios especializados.
A cefaléia tensional provoca dores que dão a sensação de cabeça pesada, apertada ou pressionada. Geralmente é uma dor fraca ou moderada que não impede você de fazer suas atividades do dia a dia e não causa outros sintomas. As causas podem ser estresse, ansiedade e depressão.
A disfunção da articulação temporomandibular e dor orofacial (ATM) tem se tornado cada vez mais frequente na população, estando muito relacionada com o estresse, cursando com dores de cabeça pela manhã ou final do dia, de caráter tensional, ao meu ver.
A cefaléia em salvas é menos frequente e tem como sinal uma dor intensa, que aparece à noite, de um lado só ou em torno dos olhos. Pode durar poucos minutos ou horas. Algumas pessoas podem ficar com os olhos vermelhos e lacrimejando, congestão nasal e a pálpebra caída do lado que tem a dor.
As causas podem ser problemas na região do cérebro conhecida como hipotálamo, responsável pelo controle da temperatura, hormônios e sono.
A enxaqueca é uma doença neurológica genética e crônica que provoca sintomas como dor de cabeça intensa e pulsante, náuseas e vômitos, além de tonturas e sensibilidade à luz.
É uma doença incapacitante, com especificidades individuais e que atinge as mulheres em particular.
A enxaqueca com aura é caracterizada por uma alteração da visão que leva ao aparecimento de pequenos pontos luminosos ou embaçamento dos limites do campo de visão, que pode durar de 15 a 60 minutos, e que é seguida por uma dor de cabeça muito forte e constante.
De acordo com a OMS, a enxaqueca com aura é reconhecida como categoria 4 na indicação do uso de pílula anticoncepcional com conteúdo de estrogênio. Essa categoria se refere às condições de saúde em que os riscos do uso da pílula são inaceitáveis, ou seja, eles não devem ser utilizados por aumentar risco de acidente vascular cerebral.
A doença precisa ser tratada com extrema atenção, porque possui gatilhos que podem variar de pessoa para pessoa, mas que precisam ser bem conhecidos.
Segundo a Sociedade Brasileira de Cefaléia, as dez principais causas ou gatilhos para desenvolver a enxaqueca são:
- Preocupações excessivas, ansiedade, tensão, estresse.
- Ficar sem comer (dieta). O jejum é o aspecto alimentar mais importante para desencadear dores de cabeça. Longo tempo sem comer pode gerar uma queda na taxa de açúcar do sangue e provocar a produção de substâncias que causam dor. O ideal é comer algo a cada três ou quatro horas, e também não exagerar na comida quando passar muito tempo em jejum.
- Dormir mal. Sono adequado é uma condição fundamental para o bem estar de uma maneira geral, e também para o equilíbrio das enxaquecas e outras dores de cabeça. Dormir pouco, dormir muito, demorar para pegar no sono, acordar no meio da noite, roncar e ter sonolência de dia, ir dormir e acordar muito tarde – são todos possíveis desencadeantes de dor de cabeça.
- Ciclo hormonal. A temida TPM (tensão pré-menstrual) carrega consigo crises de cefaléia. Classificadas por alguns em subtipos como A (ansiedade), B (breast – dor nas mamas), C (cefaléia) e D (depressão). As enxaquecas na mulher tendem a ser mais concentradas no período menstrual ou pré-menstrual, decorrentes da queda hormonal. Irregularidades menstruais, endometriose, ovários policísticos e reposição hormonal, podem ser fatores que agravam as enxaquecas.
- Irritação e alterações do humor. A irritabilidade aparece normalmente junto com uma crise de enxaqueca, mas também pode ser um motivo gerador de novas dores. Humor variado, passar muita raiva (guardando ou explodindo), impaciência, são combinações para desencadear uma enxaqueca. Tudo o que for feito no sentido de relaxar, acalmar e treinar a paciência é útil.
- Excesso de cafeína. Tomar muito café, bebidas cafeinadas (coca-cola, chás pretos) e até mesmo analgésicos que contenham cafeína são provocadores de enxaqueca a longo prazo, embora alguns acreditem que melhora no episódio agudo.
- Sedentarismo. Realizar exercícios faz com que o organismo produza endorfinas, regulariza a produção de neurotransmissores como a serotonina e melatonina, tornando o organismo mais saudável e mais resistente à dor.
- Uso excessivo de analgésicos. Os analgésicos não tratam a enxaqueca, só aliviam a intensidade e a duração das crises. O uso de analgésicos pode vir a tornar crônica, piorar a enxaqueca, tornando-a mais resistente e mais frequente.
- Alimentos como chocolate, frutas cítricas, alimentos muito gelados (sorvetes), nozes, alimentos gordurosos, condimentados, ricos em glutamato monossódico (presente em salgadinhos, molhos, adoçantes), podem agravar as enxaquecas.
- Causas genéticas. Deve-se reconhecer rapidamente a enxaqueca na infância, adolescência, início da vida adulta em filhos de pessoas que sofrem com a enxaqueca, para que ela possa ser tratada adequadamente, preventivamente, evitando que as crises apareçam e que a enxaqueca se desenvolva até um estágio crônico.
Você sabe por que as mulheres têm mais dor de cabeça que os homens?
Ainda não se sabe bem o porquê, mas as mulheres são mais atingidas do que os homens.
De acordo com a Fundação de Pesquisa da Enxaqueca nos Estados Unidos, a incidência da doença na população feminina é três vezes maior do que na masculina.
Além disso, 85% dos que sofrem da doença em sua forma crônica são mulheres.
Estima-se que cerca de 20% da população feminina sofra de enxaqueca. Dessas, 10% apresentam a forma grave da doença, com dores quase diárias – a chamada enxaqueca crônica.
A fisiopatologia da enxaqueca ainda não está totalmente elucidada, mas acredita-se que há uma descarga elétrica anômala ou uma alteração na liberação de neurotransmissores, que provocam uma vasodilatação dos vasos cerebrais, evoluindo para a compressão do tecido nervoso e a sensação de dor.
Assim, o aumento e queda dos níveis de estrogênio e progesterona que acontecem devido à situações como menstruação, uso de pílulas hormonais e gravidez podem piorar as crises de enxaqueca, o que chamamos de enxaqueca hormonal.
A explicação parece ser a de que estes hormônios (estrogênio em especial) podem ter efeitos estimulantes para o cérebro além de provocarem vasodilatação cerebral.
- Menstruação – durante o ciclo menstrual, a mulher sofre quedas e elevações nos níveis de estrogênio, o que pode causar crises de enxaqueca. Esta mudança é mais significativa durante a TPM, por isso é neste período que muitas mulheres podem apresentar quadros de dor.
Por esse motivo, algumas mulheres podem apresentar melhora dos sintomas quando fazem uso de anticoncepcional, em especial pílulas de uso contínuo sem intervalo com progestágeno, apenas que podem suspender a menstruação.
- Uso de hormônios – a elevação do estrogênio no organismo pode provocar enxaqueca, por isso algumas mulheres desenvolvem quadros de enxaqueca durante a realização de tratamentos hormonais com estrogênio, como uso de anticoncepcional em forma de pílula, injetáveis, anéis vaginais ou implantes de hormônios na pele.
Importante considerar que o principal mecanismo desencadeador é a queda do estrogênio. Logo pílulas com menor dosagem (15 picograms) ou com estrogênio natural e esquemas com pausas menores (4 dias) podem ser uma ótima opção para pacientes que não apresentam contra indicação (enxaqueca com aura)
- Gravidez – no primeiro trimestre da gravidez, a mulher passa por um período de intensas mudanças hormonais, mudanças pressóricas e glicêmicas que podem neste período desencadear mais crises de dor de cabeça.
Já ao longo do segundo e terceiro trimestres, há uma baixa constante dos níveis de estrogênio em relação aos de progesterona, o que pode ser responsável pela melhora da enxaqueca em muitos casos. Entretanto, logo após o término da gravidez, a mulher sofre outra alteração brusca destes hormônios, o que também pode voltar a desencadear novas crises associado ao puerpério (período pós-parto), muito estressante para algumas mulheres.
- Menopausa – após a menopausa, a mulher apresenta melhora da enxaqueca, o que acontece porque os valores de estrogênio ficam baixos e mais constantes. Entretanto, as mulheres que fazem terapia de reposição hormonal podem notar o surgimento de crises, já que este tratamento volta a aumentar de forma significativa os níveis de estrogênio.
A enxaqueca nem sempre se manifesta junto com a dor. Em alguns casos, as pessoas também podem sentir um ou mais dos seguintes sintomas:
Distúrbios visuais, náuseas, vômitos, tontura, extrema sensibilidade ao som, extrema sensibilidade à luz, extrema sensibilidade ao toque e ao cheiro, formigamento ou dormência nas extremidades ou rosto.
Aprendi com um amigo neurologista especialista em cefaléia, há alguns anos, que dor de cabeça nunca é normal, não devendo ser banalizada mesmo quando esporádica.
As pessoas precisam ter cuidado com aquela dor de cabeça diferente da usual ou aquela que pode ser a pior até hoje experimentada. Nessas situações, deve procurar uma emergência.
Existem muitos fatores associados à progressão da enxaqueca, mas os dois principais são problemas emocionais, como ansiedade e depressão, e o excesso de uso de remédios para tirar a dor, razão pela qual o tratamento principal a longo prazo deve focar nesses aspectos.
A alimentação (tomate, chocolate, café, coca cola, álcool, etc) pode desencadear uma enxaqueca em algumas pessoas, apesar de não podermos generalizar.
Da mesma forma, alimentos ricos em ômega 3, como óleo de peixe, sementes de chia associado a calmantes naturais (camomila, tília e erva cidreira) podem aliviar a dor de cabeça.
Como a enxaqueca tem um tempo de duração definido, entre quatro horas a três dias, geralmente o tratamento é paliativo e se resume a controlar os sintomas.
O uso de remédios para enxaqueca deve ser feito sob orientação médica. Por vezes o uso de remédios como Neosaldina, Novalgina e Maracujina pode ser suficiente, mas se a enxaqueca for persistentes ou limitar a vida da mulher, o neurologista poderá indicar o uso de remédios para enxaqueca (Amitriptilina, Lexapro, Venlafaxina, Atenolol, Topiramato, Suplemento de magnésio e coenzima Q10).
Quando a insônia é uma questão frequente, o uso da melatonina pode ser eficaz para melhores noites de sono, o que também irá auxiliar no combate à enxaqueca.
Atualmente, os neurologistas recomendam três tipos de tratamento para as pessoas que sofrem de dor de cabeça crônica: tratamento preventivo, botox ou anticorpos monoclonais.
O tratamento preventivo pode ser feito com uso de medicamentos ou mudanças de hábitos diários, como já discutimos. O que vai definir a necessidade do uso de remédios é o quadro clínico de cada paciente, individualizado pelo especialista.
Dentro do chamado ‘preventivo não medicamentoso’ podem entrar mudanças de hábitos, acupuntura, aromaterapia, ioga, pilates e outras práticas de exercício físico.
Em alguns casos, os especialistas também recomendam aplicação de botox no nervo trigêmeo para inibir a sua ação (liberar neurotransmissores associados à dor).
Há também os anticorpos monoclonais, que são medicamentos preventivos idealizados especialmente para o tratamento da enxaqueca. O Erenumabe é um medicamento biológico capaz de reduzir em até 50% as crises. Ele age na borda da meninge (membrana localizada na superfície do cérebro). Inativa um composto químico cerebral chamado CGRP, substância importante (liberada pelo nervo trigêmeo) no ciclo da enxaqueca.
Seu uso é feito uma vez por mês via injeções de alto custo. No Brasil, o valor unitário de cada injeção é muito alto, podendo chegar a R$ 1 mil a dose.
Ao invés de se automedicar ou diagnosticar, procure um médico. Até porque muitas doenças têm a cefaléia como sintoma. E o melhor a se fazer é procurar orientação para descobrir se é só uma dor de cabeça mesmo ou se ela pode ser o sinal de outra condição de saúde.
Gustavo Safe é diretor e médico especialista em endometriose no Centro Avançado em Endometriose e preservação da fertilidade, Clínica Ovular fertilidade e menopausa e Instituto Safe. Estudioso dos assuntos relacionados à saúde da mulher com enfoque na dor pélvica, infertilidade, preservação da fertilidade, endometriose, endoscopia ginecológica e cirurgias minimamente invasivas.
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